O maior do mundo


Era, de facto, o maior coleccionador do mundo, na sua especialidade. A circunstância de na sua especialidade não haver muitos outros coleccionadores – na verdade, até onde sabia, era o único – não diminuía a constatação. Era o maior, sim senhor, e ainda para mais era o único. Com muita honra, e hoje com uma vaidade que quase o fazia rebentar.

O olhar embevecido de Arsénio Vidal percorreu uma vez mais a sala onde guardava a colecção. Do chão ao tecto perfilavam-se as pequeninas gavetas, cada uma com a sua etiqueta e o seu número, todas muito ordeiras no belo móvel em carvalho, parecido com aqueles que há nas farmácias. Mas só parecido. Como o conteúdo era diferente, Arsénio Vidal tivera que mandar desenhar e fazer, de raiz, o seu próprio mobiliário. Tudo, naturalmente, do seu bolso; nada de subsídios nem apoios. Embora fosse uma colecção sem rival no planeta, neste país, já se sabe, estas coisas não contam.

Arsénio Vidal deu de ombros, não queria que os ressentimentos viessem estragar um dia tão especial. Continuou a percorrer a alcatifa com passo pausado, a abrir e fechar gavetas, a namorar as lombadas dos vastos catálogos onde cada peça tinha o seu registo completo: ano, local de origem, as influências que lhe deram forma, o percurso mais ou menos aventuroso por este mundo. Cada exemplar merecia ainda uma nota sobre a sua entrada no acervo. Às vezes duas palavras bastavam – adquirido no dia tal, por tal preço. Noutros casos havia toda uma história: buscas obstinadas, pistas falsas, euforias, decepções.

De tudo isso compilara anos antes um resumo, um guia comentado da colecção, destinado ao público leigo. Dezoito meses andara naquilo: a redigir, editar, cortar, compor. Encomendara ilustrações e desenhos técnicos. Fora ao ponto de contratar por quinze dias um fotógrafo, um brasileiro até bastante simpático, com quem, no entanto, estivera à beira de sair aos murros, tal a dificuldade de fazer o sujeito entender como se documentavam raridades daquelas. No final, calhamaço em punho, saíra à procura de quem o publicasse. Percorrera as editoras todas. Os que chegaram a recebê-lo queixaram-se do pouco dinheiro, dos poucos leitores, da pouca cultura, em suma deram-lhe poucas esperanças. Quando insistiu, tiraram-nas. Foi então às universidades. Aos ministérios. Às fundações. Em toda a parte folheavam os seus esforços com uma admiração incrédula, mas logo recomeçavam a desfiar desculpas. Quando cansou da romaria, pegou num bom pedaço das poupanças familiares e editou o livro. Ficou belíssimo. Talvez por isso, por parecer tão sumarento e valioso, não houve livreiro que não se acovardasse. A gráfica, sem ter onde entregar a tiragem, despejou-a à porta do autor, sob os protestos dos vizinhos.

Nessa noite, ao chegar a casa, Arsénio Vidal encontrou um motim. Apoiada pelas crianças, que, entretanto, sem que ele houvesse dado por isso, já tinham quase o seu tamanho, a mulher vociferava. Queria tudo aquilo dali para fora. A tonelada e meia de livros, os catálogos, os classificadores, principalmente as caixas e caixas com que ele inutilizara o quarto, entupira os corredores, começara a invadir a sala e a cozinha. Ou a colecção ou ela, berrava, histérica. Tu, disse-lhe Arsénio Vidal, para que se calasse. Mas a seguir montou para o seu verdadeiro amor aquela outra casa, uma espécie de garçonnière onde vivia a maior parte do tempo, e a mais feliz.

Era um pequeno estúdio a poucos metros de casa, mas onde ele levava uma vida quase clandestina. Nunca dissera à mulher, nem ela quis saber, que sumiço tinha dado à colecção. Melhor assim. Evitavam-se explicações e contendas sobre aquela renda extra a pagar todos os meses, acrescida da luz, da água, do telefone e do condomínio, sem falar no que gastara logo de entrada. Arsénio Vidal, normalmente avesso a esbanjamentos, tinha dotado o seu refúgio de todos os confortos que nunca se permitira em casa. Mandara instalar um ar condicionado, para resguardar a colecção da humidade e do calor. Pusera tapetes, cortinas, gravuras nas paredes, comprara um sofá e, suprema extravagância, uma mesinha de centro italiana que custara quase tanto como todo o resto. Pelo menos assim não faria má figura quando viessem os jornalistas, os professores da universidade ou outros coleccionadores, êmulos seus, admirar os seus achados. Nunca acontecera, é verdade. Mas era uma questão de tempo. 

De tudo aquilo, a compra mais importante fora uma bela secretária, com muitas gavetas e uma cadeira em pele, com braços, onde Arsénio Vidal gostava de afundar e de se pôr a girar para lá e para cá, a contemplar os seus domínios. À sua frente tinha o telefone, o fax e o computador, que agora lhe permitiam levar muito mais longe as investigações. Longas chamadas, mesmo para o estrangeiro, horas e horas na internet, tudo o que fosse preciso para descobrir e agarrar uma nova peça podia agora fazer dali, sossegadamente, sem as bisbilhotices e bocas da mulher e dos filhos.

Vinha a propósito. Aquele era um trabalho de detective, lento e tedioso, que as mais das vezes desembocava em coisa nenhuma. Arsénio Vidal não se queixava: era o preço de ser o primeiro. Não havendo mais colecções, obras de consulta, outros especialistas além dele próprio, era preciso desbravar tudo sozinho. No começo nem fora difícil: as peças andavam por aí, ignoradas, à espera apenas de alguém com o seu olho. Agora era diferente. Os espécimes que lhe faltavam já eram os raros; os que talvez nem sequer existissem. Era preciso ir atrás deles com teimosia e cegueira, cruzando os dedos para que não fossem mais uma miragem.  Quase sempre eram. Quando, porém, capturava algum, Arsénio Vidal sentia-se compensado de tudo. Cada um daqueles minúsculos tesouros era uma vitória do seu método, da sua persistência, da sua paixão.

E nenhum outro tanto quanto este.

Arsénio Vidal encheu o peito, cedeu mais uma vez à tentação de se aproximar, de mansinho, da terceira gaveta da quinta fila do arquivador, a contar de cima para baixo. Abriu-a devagar, em bicos de pés, como quem afasta a manta do bebé adormecido.

Lá estava.

Era uma beleza. Para quem não soubesse, passaria por uma peça igual a tantas outras. Não tinha uma cor especialmente vistosa. A forma, assim de relance, tampouco era nada de especial. Mas aquele detalhe: no canto direito, pudicamente escondida sob uma camada translúcida, a minúscula risquinha que mudava tudo. Arsénio Vidal não resistiu a abrir um pouco mais a gaveta, virar para cima, com a pinça, o sítio exacto da risquinha, confirmar pela enésima vez se ainda estava lá. Estava. Estaria para sempre. Pela enésima vez, a ternura encharcou-lhe os olhos.

Era a sua aquisição mais preciosa. Antes de a ter ali, tivera-a, anos a fio, nos seus sonhos. De tal maneira que quando, meses antes, lhe surgira por acaso aquela pista, lhe parecera uma fortuna tão completa e improvável que, para evitar um desgosto, preferira não a levar muito a sério. Mas os indícios avolumaram-se, os testemunhos foram concordando, o rasto tornou-se cada vez mais fresco. Por fim, quando com chocante indiferença um dentista de Badajoz lhe confirmou ter a peça em seu poder, Arsénio Vidal disfarçou a emoção com uma crise de tosse. Baixinho, para não espantar a caça, perguntou ao sujeito quanto pedia por ela. O espanhol deu uma gargalhada, respondeu-lhe que não se incomodasse, não era nada, mandava-lhe já aquilo pelo correio.

Os dias seguintes foram de absoluto pavor. Como era o outro que pagava a remessa, Arsénio Vidal não tivera coragem de lhe recomendar correio urgente, registado, várias camadas de acolchoamento no envelope. À noite, sem conseguir dormir, enchia o tecto do quarto de visões aterrorizantes: armazéns imensos e caóticos, comboios operados por incompetentes, labirintos de esteiras rolantes onde milhões de envelopes, caixas, pacotes, tinham que encontrar sozinhos o caminho para casa. Era tão longe, Badajoz. Tantas estradas. Tantos extravios possíveis. Por que não se metera no carro e não fora até lá?

Fazia parte do suplício estar às oito da manhã, todos os dias, à janela do estúdio, a controlar cada movimento na rua, e dali não arredar até às dez, dez e meia, que era quando finalmente passava o carteiro. Mal o via apontar na esquina, Arsénio Vidal descia de escada os cinco andares, pulando os degraus, e atirava-se sobre o homem, quase a lhe arrancar as cartas da mão. Durante quatro dias o sujeito não teve mais a oferecer do que contas a pagar, extractos do banco, a publicidade do costume. Ao quinto, prevenido, já da esquina foi acenando, sorridente, com o envelope vindo de Espanha.

Arsénio Vidal chegou cá em baixo ofegante, tão emocionado e grato que quase abraçou o carteiro. Ficou-se pelo quase. Agora, era esse abraço que lhe fazia falta.

Desde que rasgara o envelope já tinha visto e revisto por todos os lados a nova conquista. Já a pusera na gaveta e voltara a tirar. Já fora buscar a lupa para examinar a risquinha, uma régua para lhe tirar as medidas, a máquina para as fotografias. Já redigira, para a próxima edição, agora urgente, do guia ilustrado, não só a descrição pormenorizada da peça como a crónica da sua descoberta. Já a pusera uma vez mais no seu sítio, e desde então, da secretária à gaveta, da gaveta à janela, da janela à secretária, já dera centenas de passos sobre os quatro metros por três e meio da salinha. E agora?

Não fosse a sua colecção um caso tão especial e era problema que nem se punha. Mal a notícia se soubesse, os coleccionadores amigos viriam dar os parabéns, os rivais disfarçariam a inveja com ahs e ohs. E o maior coleccionador do mundo, paciente e solícito, não se importaria de repetir a mesma história quantas vezes lhe pedissem. Mas Arsénio Vidal era um pioneiro. Um precursor. Um visionário. E agora não tinha com quem celebrar.

Já eram quase cinco da tarde e desde as sete estava fora de casa. De manhã saltara da cama tão nervoso que não conseguira comer nada; depois, com a excitação do dia, também se esquecera de almoçar. Era natural, agora que pensava nisso, que lhe doesse tanto o estômago. Pôs o casaco e saiu, sem saber para onde.

Se fosse um dia normal iria para casa, talvez parando antes no mercado em frente para não chegar de mãos vazias. A mulher perguntaria, fingindo interesse, onde tinha andado, e ele responderia que por aí, a tratar de umas coisas. Os filhos, esses, estavam sempre a chegar e a sair com pressa para qualquer lado. Não tinham tempo para grandes conversas – o que, para Arsénio Vidal, normalmente estava óptimo. Mas hoje, não.

Num dia normal não teria encontrado a peça mais importante da sua colecção. Deu dois passos na direcção de casa, parou, fez meia volta. Não sabia onde ir mas pôs-se a caminhar com força, com passos grandes e cada vez mais rápido. Parecia ter pressa de ir para bem longe, quanto mais longe e mais rápido melhor. Cruzava as ruas sem olhar para os lados, os carros, se quisessem, que parassem. Quando chegou à ladeira que ia dar ao rio, a marcha forçada já se tinha transformado numa franca corrida. Arsénio Vidal, que desde os tempos do liceu nunca fizera qualquer exercício, agora estava a correr pelas ruas.

Correu até o corpo exigir que parasse. Apoiou-se ofegante numa coisa qualquer, um poste com uma placa a indicar que não havia saída. Ficou a respirar de olhos fechados, com a fome e o cansaço a pôr bolinhas dançarinas por baixo das suas pálpebras. Quando abriu os olhos reparou onde estava: à beira do rio, numa parte baldia do porto onde nunca pusera os pés. O entardecer dava às águas uma opacidade cinzenta. Havia barcos iluminados, mas estavam longe, muito longe, quase tanto como a linha pálida que hoje fazia as vezes de crepúsculo. Do lado da terra, menos ainda: só as paredes dos armazéns em ruínas. E, lá ao fundo, no último deles, um letreiro de neon a piscar. Arsénio Vidal caminhou para lá.

Ainda era um bom bocado; quando chegou, a noite já caíra de vez. Arsénio Vidal olhou para trás, considerou o caminho por onde viera, agora completamente escuro, e cruzou a porta da taberna. Era estranho haver um local daqueles ali, no meio de sítio nenhum. Não havia clientes. Só, por trás do balcão, um velho muito velho, com a cara amarrada e olhos sem vida. Arsénio Vidal pediu batatas e uma cerveja.

Raramente bebia.  Na juventude sim, como toda a gente, mas depois, com a vida que levava, poucos amigos, pouca paciência para parentes, domingos, Natais em casa da sogra, as ocasiões foram ficando mais raras. Um copo de Porto aqui e ali e era tudo. Mas hoje era um dia especial. Deitou abaixo de uma vez a caneca, sem tocar nas batatas, mandou vir outra. Esvaziou-a e pediu mais outra. Quando, vindos não se sabe de onde, surgiram à porta aqueles quatro sujeitos, Arsénio Vidal levantou-se como um boneco de molas, derrubando a cadeira, quase derrubando a cerveja, e foi recebê-los de braços abertos.

Antes que pudessem reagir já lhes contara tudo. Era o maior coleccionador do mundo e nem sabiam o que tinha conseguido. Que se servissem, portanto, bebessem à vontade, era por sua conta. Os homens entreolharam-se, quiseram saber que colecção era aquela. Arsénio Vidal explicou tudo muito alto, com muitas palavras, deitando cá para fora muitas gotas de saliva e puxando ora um, ora outro pela manga, para lhes repetir ao ouvido os detalhes. Nenhum deles percebeu muito bem, mas aceitaram os copos, os tira-gostos, ergueram muitos brindes. Ao maior coleccionador do mundo. À risquinha. Arsénio Vidal era um homem feliz.

Tão feliz que, quando um dos quatro – um mais moreno e ainda mais musculoso do que os outros, que até ali quase não abrira a boca, ficara só a observá-lo de longe com uns olhos muito pretos -  quando esse tal Gedeão, que era assim que se chamava, lançou a proposta, Arsénio Vidal nem pensou duas vezes. Já tinham bebido e rido juntos e trocado palmadas nas costas. Já o tinham ouvido dizer mal da mulher e das editoras e do governo e da puta que os pariu a todos, que não reconheciam o valor de uma colecção como a sua, e tinham-no apoiado sem reservas. Só faltava mesmo, para coroar ocasião tão fraterna, fazer aquilo que o Gedeão propôs e que Arsénio Vidal aceitou no mesmo instante: mandar vir um táxi e irem todos conhecer de perto aquela maravilha que chegara de Espanha.

Arsénio Vidal estava bêbado, mas não tão completamente que lhe escapasse a importância da ocasião. Quando acendeu a luz e os quatro entraram no estúdio, só ao princípio um pouco inibidos por aqueles móveis caros, pela alcatifa limpíssima, tudo a destoar o mais possível das suas roupas surradas, das barbas fora de prazo, do cheiro acumulado a bagaço e suor,  o maior coleccionador do mundo empertigou-se para recolher, por fim, o que lhe era devido: a admiração de um público. Não era, certamente, o público que imaginara. Mas era uma gente boa, simples, camarada. E tinham vindo até ali unicamente para conhecer a sua colecção.

Gedeão, por exemplo, assim que acabou de examinar, ali mesmo da entrada, a sala, a mesinha italiana, o arquivo de madeira, o sofá e o computador, quis logo saber da célebre peça. Arsénio Vidal fez-lhe solenemente sinal que esperasse, foi à secretária, muniu-se da pinça, da lupa, em seguida acompanhou o visitante até à terceira gaveta da quinta fila do arquivador, a contar de cima para baixo. Abriu a gaveta como num palco: fazia render o suspense, voltava-se para a plateia, teatral, antes de cada movimento. Mas quando preparava a pinça para levantar, com o devido cuidado, o seu tesouro, a mão morena, peluda e não muito limpa do seu convidado meteu-se na gaveta e tirou de lá a peça, sem cuidado nenhum.

Arsénio Vidal balbuciou um protesto, mas Gedeão, entretido em decifrar que diabo aquilo podia ter de tão valioso, não lhe ligou nenhuma. Quanto aos outros três, que enquanto Arsénio Vidal preparava o seu número se tinham todos amontoado ao seu redor, agora estavam repartidos pelas outras gavetas, abrindo-as e fechando-as sem cerimónia, tirando de lá peça atrás de peça, que giravam nas mãos, olhavam contra a luz, mostravam uns aos outros com comentários de fregueses enganados, e em seguida deixavam cair para o chão, como se fosse lixo.

Arsénio Vidal não sabia se gritava, se tinha um colapso, se se atirava àqueles porcos que lhe profanavam o santuário. Na dúvida fez um pouco de tudo. Desatou aos berros, aos pontapés e aos socos em todas as direcções. Quando Gedeão o agarrou, cingindo-lhe a barriga pelas costas, Arsénio Vidal cravou-lhe no braço os dentes e as unhas até fazer sangue. O convidado não perdeu muito tempo a berrar com a dor. Esmurrou a cara do maior coleccionador do mundo até que ele o soltasse. Depois, com a ajuda dos outros, tratou de fazer com que nunca mais mordesse ninguém.

Ainda parecia ser noite quando Arsénio Vidal abriu o único olho que conseguia mexer. Não sabia quanto tempo teria passado. Respirava com dificuldade, a cabeça latejava, qualquer movimento era impensável. O máximo que conseguiu, da posição em que estava, foi mover lentamente o olhar à sua volta, inspeccionando o apartamento. A mesinha italiana estava virada de lado, sem metade do tampo de vidro. Na secretária, o telefone tinha o fio arrancado. O fax e o computador não estavam lá. Sobre a alcatifa, onde crescia uma mancha escura que devia ser o seu próprio sangue, espalhavam-se, algumas inteiras, outras partidas, as peças da colecção. Incluindo – e no peito doído de Arsénio Vidal o coração disparou – a dez centímetros da sua mão esquerda, a única que realmente importava.

Os estúpidos.

Levaram a porcaria do computador e deixaram-na ali.

Arsénio Vidal comprimiu os dentes, conseguiu que o braço se mexesse até poder alcançá-la. Cada vez que tentava mover os dedos a dor subia pelo antebraço, pelo ombro, até à insuportável pontada no meio das costas; mesmo assim conseguiu agarrá-la, erguê-la alguns centímetros do chão, para que o seu olho solitário, mesmo à distância, a pudesse examinar. Estava intacta. No canto direito, sob a sua camada semitransparente, a minúscula risquinha ainda estava lá.

Quando a mulher veio reconhecer o corpo, o polícia perguntou-lhe o que era aquilo que o seu marido tinha na mão. A mulher soltou um longo suspiro. Os seus olhos desfocaram o inspector, foram fixar-se lá atrás, naquele horrível móvel cheio de gavetinhas. Quando aquilo acabasse ainda teria que voltar ali, devolver o apartamento, arranjar destino para todas aquelas coisas. A secretária era bonita, aproveitava-se para os miúdos. Os livros, os catálogos, os classificadores, tinha muita pena, mas era desta que iam para o lixo. E aquele móvel. Quem é que ia querer aquele móvel. Talvez se o vendesse a alguma farmácia.






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